Depois de serem forçados a partir para linhas de crédito mais arriscadas e com retorno maior durante a pandemia, quando a taxa Selic estava na mínima histórica de 2%, os bancos voltaram a colocar o pé no freio. O aumento da inadimplência e, consequentemente, das provisões para perdas levou as instituições a ajustarem suas carteiras, seja com maior conservadorismo na concessão de crédito seja aumentando a exposição em linhas mais seguras, como o consignado, o que elevou as taxas médias dos juros cobrados nessas modalidades.
— De forma geral, os bancos vêm ao longo do ano fazendo ajustes na regra de concessão. O banco pode até continuar crescendo no crédito, mas ele está mudando a avaliação para que tipo de cliente está dando acesso ao crédito. O discurso dos bancos tem sido mais conservador — avalia o analista-chefe do setor financeiro da XP, Renan Manda.
O esforço para diversificar a carteira de crédito e se blindar da inadimplência foi mencionado pelos executivos nas apresentações de resultados. No consignado, as parcelas são descontadas na folha, eliminando os riscos.
O CEO do Itaú, Milton Maluhy Filho, explicou, na divulgação do balanço trimestral, que foram feitos ajustes relevantes na concessão de crédito. O banco registrou uma inadimplência mais controlada que a de seus pares. Maluhy destacou o crescimento em consignado de órgãos públicos, estratégia também adotada pelo Santander.
Risco no limite
Segundo dados do Banco Central, a taxa média de juros no consignado para trabalhadores do setor privado atingiu 45,6% em outubro. Para beneficiários do INSS, chegou a 26,9%, e para servidores públicos, a 26,4%. Um ano antes, as taxas eram de 32,4%, 20,6% e 17,9%, respectivamente.
As elevações são superiores às vistas em instrumentos de crédito considerados mais arriscados para os bancos, como o cheque especial, que continuam caros justamente pelo risco embutido.
No caso do cheque especial, a taxa média foi de 132,5% em outubro deste ano contra 128,2% no mesmo mês de 2021. Já no crédito pessoal não consignado, a taxa média foi de 83,5%, ante 83,6%, na mesma comparação.
— Os bancos estão, sim, focando em crédito consignado exatamente por conta das garantias, de ser um crédito de menor risco dado esse nível de inadimplência. Mas há certa limitação de aumento de taxa, por conta da maior concorrência — diz o chefe de análise da Eleven, Carlos Dalzoto.
O analista da Senso Corretora, João Frota, lembra que, quando a Selic estava na mínima histórica, os bancos foram para cartão de crédito, cheque especial e crédito direto:
— Estava valendo a pena ir para esse ambiente de risco, mas agora chegou ao limite e eles estão procurando agora se blindar mais por conta da inadimplência.
O CEO do Bradesco, Octavio de Lazari Junior, admitiu, na apresentação dos resultados trimestrais, que a maior exposição do banco a classes de menor poder aquisitivo, mais suscetíveis ao cenário macro, afetou os números:
— A inadimplência cresceu no segmento massificado de baixa renda para pessoas físicas e para o segmento de micro e pequenas empresas.
No terceiro trimestre, a carteira de crédito somada de Itaú Unibanco, Santander, Banco do Brasil e Bradesco totalizou R$ 3,524 trilhões, alta de 14,6% frente ao mesmo período de 2021. Já as provisões para devedores duvidosos (PDD) atingiram R$ 26,268 bilhões, um salto de 60%.
Cenário melhor em 2023
Para analistas, a inadimplência continuará elevada
— Para o próximo trimestre, teremos uma inadimplência no patamar atual ou até um pouco maior — diz Frota, da Senso.
Ainda assim, Manda, da XP, espera uma melhora de cenário em 2023, apesar da desaceleração da economia global:
— A inflação cedendo e os juros caindo mais no segundo semestre acabam sendo um cenário favorável. É um estímulo para engrenar a atividade econômica, sendo menos oneroso para os empréstimos.
Fonte: O Globo
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