Um estudo feito para a Abranet, associação que reúne empresas financeiras com 70 milhões de clientes, mostra que, ao contrário do que afirmam os bancos, a inadimplência nas compras parceladas por cartão de crédito é equivalente à daqueles que optam por pagar de uma só vez no vencimento da fatura seguinte.
O documento, a que o Painel S.A. teve acesso, será apresentado nesta segunda (14) ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Na semana passada, ele afirmou que pretende acabar com o rotativo do cartão, porque a inadimplência média, em torno de 53%, mostra que o produto precisa ser revisto.
Um grupo de trabalho com representantes do BC e do mercado considera que essa situação acaba pressionando a Selic, a taxa básica de juros, para patamares elevados.
A declaração, dada durante audiência no Senado, causou surpresa no grupo de trabalho que, há três meses, discute o assunto.
Como noticiou a coluna, Campos Neto tomou um puxão de orelha por, supostamente, se antecipar ao término das discussões —representantes do varejo e das maquininhas não haviam sido integrados ao grupo de trabalho do rotativo.
O grupo, que funciona no BC, é formado pelo presidente e outros dois diretores da autarquia, Marcos Pinto (Fazenda), representantes da Febraban e dos quatro maiores emissores de cartões (Itaú, Bradesco, Santander e Nubank).
Por uma das mudanças em debate, seria criada uma taxa para as compras parceladas sem juros, a ser aplicada a partir da quarta prestação. Para os bancos, o parcelamento sem juros, a perder de vista, tem contribuído para o calote nas faturas e precisa ser desestimulado.
No entanto, de acordo com o estudo da Abranet, que representa cerca de 10% dos cartões emitidos no mercado, a taxa de inadimplência entre os que só compram à vista é de 31%. Entre os que só compram parcelado, ela é de 30%. O percentual é o mesmo (30%) no grupo que compra das duas formas —à vista e também a prazo.
Para a presidente da entidade, Carol Conway, causa “estranheza e preocupação” que uma decisão tão importante e impactante para todo o mercado esteja sendo discutida com apenas uma das partes envolvidas.
“Prejudicar o modelo de compras parceladas em cartão de crédito no Brasil, que é responsável por 50% do volume de tudo o que é transacionado em cartões de crédito, reduzirá drasticamente o consumo e impactará todo o varejo, os lojistas de todos os portes, principalmente os pequenos, as empresas de maquininha de cartão e todo o ecossistema que funciona ao redor desse mercado”, disse à coluna.
“É inaceitável que uma solução sobre um assunto dessa magnitude e importância esteja sendo discutida de maneira unilateral, pelos grandes bancos, que historicamente têm os maiores lucros do país e o maior retorno sobre o capital dos bancos do mundo.”
Para ela, atacar o parcelado é uma prática comum entre os bancos quando os juros de cartão de crédito, hoje na casa de 440% ao ano, são questionados.
“Na visão das nossas associadas, esses assuntos não têm relação e apontam que a inadimplência de quem compra parcelado é menor do que a de quem compra à vista. Tanto é que elas oferecem parcelado sem juros, com opção de parcelar em 18 vezes, não apenas 12 vezes, como é praxe do mercado.”
COMPETIÇÃO
A Abranet considera ainda que, se os bancos não querem mais assumir o risco da inadimplência do parcelado, melhor seria não oferecer mais essa opção aos clientes, já que os bancos são os donos dos emissores de cartões.
“A solução para os altos juros está dentro dos próprios bancos, que nos últimos anos parece que foram mais agressivos do que deveriam na concessão de crédito e que têm políticas como a isenção de anuidade combinada com benefícios (milhas, salas vip); e todo esse custo precisa ser coberto através dos juros cobrados do rotativo. É o cenário já conhecido da baixa renda subsidiando o benefício da alta renda.”
Para a Abranet, o que realmente derrubará os juros será o aumento da competição, por meio de medidas como a portabilidade de dívida de cartão, assim como existe nos EUA.
Por ela, o cliente consegue facilmente transferir sua dívida de um banco para outra instituição financeira que ofereça melhores condições.
Fonte: Folha de S. Paulo
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