Início » Para 56%, país tem poucas mulheres em cargos de chefia, segundo Datafolha

Para 56%, país tem poucas mulheres em cargos de chefia, segundo Datafolha

postado Assessoria

“Já me disseram ‘o trabalho foi muito bem executado, nem parece de uma mulher’, como se fosse um elogio.” “Perdi a conta do número de vezes que me olharam atravessado por ocupar um espaço onde predominava o padrão de pessoas brancas.”

Quem conta é a executiva Rachel Maia, que comandou a Lacoste e a Pandora, em seu livro “Meu Caminho até a Cadeira Número 1” (ed. Globo; 248 págs; R$ 34,99).

Mulher, negra e de origem simples, ela narra o desafio múltiplo que precisou superar para dividir mesas de reunião ocupadas majoritariamente por homens brancos.

Trajetórias como a dela são exceção, mas o incômodo com a falta de representatividade de mulheres e pessoas negras em cargos executivos de comando não é.

Segundo o Datafolha, para 56% dos brasileiros, o número de mulheres hoje em cargos de chefia nas empresas é menor do que deveria e 60% dizem crer que há menos pessoas negras do que seria adequado nessas posições de liderança.

A pesquisa foi feita nos dias 29 e 30 de março, com 2.028 pessoas de 126 municípios de todo o Brasil. A margem de erro para o total da amostra é de 2 pontos, para mais e para menos.

Dos entrevistados, 25% dizem considerar adequado o número de mulheres ocupando cargos de chefia e somente 17% responderam que esse número é maior do que deveria.

Também 24% afirmam que o número de pessoas negras em postos de liderança nas empresas é adequado e 12% consideram que é maior do que deveria.

O desconforto com a baixa representatividade feminina no topo das empresas é elevado entre os que têm de 16 a 24 anos (61%), ensino superior (66%) e são estudantes (69%).

Já os que demonstram insatisfação com o baixo número de pessoas negras na chefia é alto entre as mulheres (64%) e os que têm o PT como partido de preferência (64%).

A distância de oportunidades entre homens e mulheres e entre pessoas brancas e negras no país tem sido demonstrada de diversas formas.

Em 2021, um estudo do Made/USP (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades, da Universidade de São Paulo) apontava que os 705 mil homens brancos que fazem parte do 1% mais rico do país e representam 0,56% da população adulta têm 15,3% de toda a renda, uma fatia maior do que a de todas as mulheres negras adultas juntas.

Segundo a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, do IBGE, em 2022, 19,7% das mulheres negras ocupadas estavam no setor de educação, saúde humana e serviços sociais; no comércio, 19,2%; em serviços domésticos, de 16,4%.

Entre os homens ocupados negros, 19,5% estavam no comércio; no setor de construção, 14,8%; na indústria, 14,4%; na agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura, 14,1%.

Segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), trabalhadoras negras receberam em 2022 46,3% do rendimento médio obtido por homens brancos. Para o homem negro, essa proporção foi de 58,8%.

No ano passado, a edição mais recente do Ifer (Índice Folha de Equilíbrio Racial) apontou que o Brasil deve levar quase 116 anos para que pretos e pardos tenham acesso às mesmas oportunidades que os brancos.

De acordo com dados de 2016 do Instituto Ethos, as mulheres representam 13,6% do quadro executivo e as pessoas negras são 4,7% desse grupo nas 500 maiores empresas do Brasil.

REPRESENTATIVIDADE NA POLÍTICA TAMBÉM É INSUFICIENTE, APONTA DATAFOLHA

O Datafolha também perguntou como os brasileiros consideravam o espaço ocupado pelas mulheres e pelas pessoas negras em cargos políticos.

O espaço ocupado pelas mulheres na política também é considerado insuficiente: 57% dizem que ele é menor do que deveria, 26% que é adequado e 15% que é maior.

Entre as mulheres, a percepção de representatividade insuficiente é de 60% (ante 54% entre homens), de 64% entre os mais jovens (de 16 a 24 anos) e de 60% entre eleitores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (entre os de Jair Bolsonaro, é de 54%).

Sobre a presença na política de pessoas negras, os resultados são semelhantes: está abaixo do adequado para 60%, suficiente para 24% e está acima para 13%.

As candidaturas femininas bateram recorde em 2022, com 33,3% dos registros nas esferas federal, estadual e distrital. As mulheres representam 53% do eleitorado do país, o que corresponde a 82 milhões de votantes, segundo a Agência Senado.

Em 2009, a legislação assegurou o percentual mínimo de 30% e máximo de 70% para candidaturas de cada sexo. Além disso, destina pelo menos 30% dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, bem como do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV.

Um obstáculo, no entanto, para a ampliação da participação feminina na política tem sido a ocorrência de candidaturas “laranjas”, apenas para cumprir as cotas.

Para Caio Magri, diretor presidente do Instituto Ethos, enquanto a participação de mulheres e pessoas negras na política é mais fácil de ser aferida, é mais difícil medir esse desequilíbrio nas empresas privadas.

“Na política, as regras existem e é preciso evitar fraudes. Mas poucas empresas têm centros internos de diversidade e políticas construídas com metodologia correta de autodeclaração. Pesquisas que fizemos também apontam que a percepção que os gestores têm da diversidade no comando de suas empresas é mais otimista do que a realidade.”

Ele acrescenta que a representatividade feminina e de pessoas negras nas empresas e em posições políticas deveria refletir a realidade da população brasileira. “Deveria ser a representação percentual da demografia, da fatia de mulheres e das pessoas negras que temos no mercado de trabalho.”

Além das cotas e da política de equiparação salarial entre homens e mulheres —também proposta pelo governo—, os especialistas reforçam a necessidade de criar lideranças locais para ocupar espaços nas empresas e no Estado.

“A equidade racial e de gênero também é importante, porque a população não se vê representada nas instituições“, diz Clarissa Malinverni, do Movimento Pessoas à Frente, de discussão e elaboração de políticas públicas.

Como exemplo de políticas públicas que podem ajudar a reverter essa percepção, ela cita um decreto assinado pelo presidente Lula em março, que estabelece cota para pessoas negras em, no mínimo, 30% dos cargos comissionados e de confiança no governo federal.

Apesar de ver avanços recentes nas políticas públicas, ela reforça a importância de estados e municípios se comprometerem a adotar medidas afirmativas, que podem servir de exemplos para as empresas. “Também é preciso aumentar a transparência nos dados fora da órbita federal, para entendermos o tamanho do problema.”

Fonte: Folha de S. Paulo

www.contec.org.br

Deixe um Comentário

Notícias Relacionadas