A Plataforma de Cooperação Tributária para a América Latina e o Caribe (PTLAC) realizou, no dia 25 de novembro de 2025, no Salão Nobre do Bloco R da Esplanada dos Ministérios, em Brasília, o seminário “PTLAC – Caminhos para a Justiça Fiscal na América Latina e Caribe”, evento acompanhado pela CONTEC. O encontro, organizado pela presidência brasileira da PTLAC em parceria com o Ministério da Fazenda e a CEPAL, reuniu representantes de governos, organismos internacionais, academia, movimentos sociais e organizações da sociedade civil, em um debate amplo sobre como sistemas tributários mais justos podem enfrentar desigualdades, fortalecer direitos e contribuir para a transição ecológica.
Abertura
A mesa de abertura, mediada por Mariana Davi, contou com a participação de Guilherme Mello, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda; Cláudia Pimentel, subsecretária de Tributação e Contencioso; Antônio Freitas, subsecretário de Finanças Internacionais e Cooperação Econômica; Dalmiro Morán, oficial de Assuntos Econômicos da CEPAL; e Jorge Coronado, representante da rede LATINDADD. As autoridades destacaram que a PTLAC nasce de um diagnóstico comum na região: a persistência de desigualdades históricas e a necessidade de fortalecer a cooperação entre os países para enfrentar evasão fiscal, revisar incentivos ineficientes e influenciar a governança tributária global. Também foi ressaltado o papel central da sociedade civil e da academia no avanço dessas agendas.

Painel 1 – Progressividade Tributária e Justiça Fiscal
O primeiro painel, mediado por Poliana Garcia, trouxe reflexões aprofundadas sobre o papel da progressividade tributária na redução das desigualdades. O especialista do PNUD, Ricardo Guerrero, apresentou dados comparativos da região, mostrando que sistemas tributários regressivos limitam a capacidade dos Estados de promover redistribuição de renda. Em seguida, Sérgio Gobetti, pesquisador do IPEA, destacou evidências robustas sobre a forte concentração de renda no topo, ressaltando que o Brasil possui uma elite que paga proporcionalmente menos impostos do que a classe média e os trabalhadores. Gobetti deu ênfase à pejotização, mecanismo amplamente utilizado por profissionais de alta renda para reduzir sua carga tributária, o que, além de agravar desigualdades, compromete o financiamento da Previdência e distorce a concorrência no mercado de trabalho.
A pesquisadora do INESC, Nathalie Beghin, reforçou que a regressividade tributária afeta de maneira mais intensa mulheres, negros e populações de baixa renda. Já Florencia Lorenzo, da Tax Justice Network, argumentou que a justiça fiscal é impossível sem enfrentar práticas de planejamento tributário agressivo e sem maior transparência internacional. O painel convergiu na necessidade urgente de reformas que ampliem a tributação sobre renda e patrimônio, reduzindo a carga indireta que pesa sobre os trabalhadores.

Painel 2 – Benefícios Tributários, Transparência, Monitoramento, Avaliação e Revisão
No segundo painel, Dalmiro Morán (CEPAL) apresentou diagnósticos sobre o peso das renúncias fiscais na capacidade arrecadatória dos países latino-americanos, destacando que muitos benefícios não possuem comprovação de impacto econômico ou social. O estatístico e economista Rafael de Acypreste demonstrou metodologias para avaliar incentivos fiscais para além da ótica do crescimento econômico, incorporando impactos sociais e ambientais.
A representante da Secretaria de Política Econômica, Ana Paula Guidolin, detalhou como o governo brasileiro tem investido em maior transparência e em instrumentos de avaliação. Na sequência, Verónica Grondona (ICRICT) reforçou que grandes corporações globais se aproveitam de brechas e opacidades dos sistemas tributários para reduzir artificialmente sua tributação, o que torna a revisão dos benefícios ainda mais urgente.
O painel teve um dos pontos altos com Livi Gerbase, do CICTAR, que trouxe dados sobre a atuação de grandes empresas, a influência do poder econômico na formulação tributária e a importância de envolver sindicatos e movimentos sociais na revisão dos incentivos. Ela ressaltou que a luta dos trabalhadores deve ser levada em conta, especialmente quando benefícios concedidos a empresas resultam em perda de arrecadação que compromete investimentos públicos essenciais, como saúde, educação e políticas de proteção social.

Painel 3 – Direitos Humanos, Tributação e Desenvolvimento Sustentável
O painel final, mediado por Juliana Nascimento, aprofundou a relação entre política fiscal, desigualdades e transição ecológica. A especialista em tributação ambiental internacional Tatiana Falcão apresentou a proposta de um tratado multilateral de tributação de carbono, que permitiria alinhar metas climáticas entre países da região e evitar mecanismos punitivos de fronteira impostos por economias centrais. Com base nos slides e análises apresentados, Tatiana destacou que países latino-americanos já possuem experiências relevantes com tributos sobre carbono, e que uma estrutura regional poderia fortalecer a posição da América Latina na negociação global.
O pesquisador do IPEA e representante do Ministério da Fazenda, Rodrigo Octávio Orair, destacou que o Brasil vive um “divisor de águas” após aprovar reformas tributárias que agora entram na fase de implementação. Ele enfatizou a inovação trazida pela avaliação quinquenal dos benefícios fiscais, prevista na Constituição e regulamentada por lei complementar, que obrigará União, estados e municípios a revisarem periodicamente incentivos, incluindo critérios de gênero, raça, impacto ambiental e desigualdade. Essa fala é especialmente relevante para a CONTEC, que há anos acompanha o impacto de renúncias fiscais sobre políticas públicas essenciais ao trabalhador.
A representante da Oxfam Internacional, Grazielle Custódio, reforçou a necessidade de avaliações ex-ante e ex-post de políticas tributárias, destacando que, sem mecanismos de vinculação e correção automática, reformas podem perpetuar violações de direitos humanos. Por fim, German Niño, do FOSPA, relacionou a crise climática a uma “crise civilizatória” e defendeu que sistemas fiscais precisam incorporar a complexidade dos territórios, a proteção ambiental e a soberania dos povos tradicionais.

Encerramento
A sessão final reuniu Antônio Freitas (Ministério da Fazenda), João Paulo Martins (Receita Federal), Ana Paula Guidolin (Secretaria de Política Econômica) e Camila Barreto (GI-ESCR). Os participantes reforçaram a importância do diálogo entre governos, especialistas e sociedade civil para fortalecer a justiça fiscal e ampliar a capacidade de financiamento das políticas sociais. Camila destacou que a PTLAC é uma iniciativa única no mundo, combinando cooperação técnica, política e social, e chamou atenção para a necessidade de ampliar seu alcance em 2026.
Relevância para os trabalhadores bancários
A CONTEC destaca que debates sobre progressividade tributária, revisão de incentivos, pejotização, avaliação de renúncias fiscais e financiamento de políticas públicas têm impacto direto na classe trabalhadora. Um sistema tributário mais justo fortalece o Estado, amplia direitos, combate desigualdades e melhora as condições de vida da população.
Por Jéssica Alencar
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