A Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU) deflagraram nesta quarta-feira, 23, a operação Sem Desconto, para combater um esquema criminoso que promoveu desvios bilionários de proventos de aposentados e pensionistas Instituto Nacional de Seguro Social (INSS).
Desde 2016, cerca de R$ 7,99 bilhões em recursos foram descontados em folha de aposentados e pensionistas, e as suspeitas são de que grande parte desse valor tenha sido descontada sem autorização. Segundo a CGU, foram realizadas entrevistas com 1.300 aposentados que tiveram descontos, e 97% deles relataram não ter dado consentimento para a medida.
“Ainda não dá para dizer que 100% do dinheiro descontado, dos R$ 6,3 bilhões (entre 2019 e 2024), foi descontado de forma irregular. Mas a nossa amostra (de 1300 casos) deu um número de 97%. Então dá para dizer com tranquilidade que a maioria não tinha autorizado o desconto”, afirmou o ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinicius Marques de Carvalho.
Como funcionava o esquema?
Segundo a CGU e o Ministério da Justiça, os descontos começaram em 2016, mas escalaram em 2023 e 2024. Entidades de classe, como associações e sindicatos, formalizavam Acordos de Cooperação Técnica (ACT) com o INSS, o que permitia o desconto em folha dos beneficiários do órgão. A autorização para o desconto, contudo, em muitos casos, era fraudada.
“Para o desconto ser realizado, a entidade precisa da autorização expressa e individual de cada beneficiário para realizar o desconto de sua mensalidade associativa. Na investigação, foram identificadas, porém, a ausência de verificação rigorosa dessa autorização e a possibilidade de falsificação de documentos de filiação e autorização”, diz apresentação da PF.
Segundo o documento, 11 entidades associativas foram alvo de medidas judiciais, desde 2023, quando a CGU deu início a uma série de apurações sobre o aumento das entidades, e dos valores descontados.
“A partir desse processo, foram feitas auditorias em 29 entidades que tinham Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com o INSS. A CGU identificou que as entidades não tinham estrutura operacional para prestar os serviços que ofereciam aos beneficiários e que, dos entrevistados, a maioria não havia autorizado os descontos. A CGU também identificou que 70% das 29 entidades analisadas não entregaram a documentação completa ao INSS”, diz a CGU.
Veja abaixo as entidades que foram alvo de medidas judiciais, segundo a CGU e o Ministério da Justiça, e os anos em que convênios com o INSS foram firmados.
- Ambec (2017)
- Sindnapi/FS (2014)
- AAPB (2021)
- AAPEN (anteriormente denominada ABSP) (2023)
- Contag (1994)
- AAPPS Universo (2022)
- Unaspub (2022)
- Conafer (2017)
- APDAP Prev (anteriormente denominada Acolher) (2022)
- ABCB/Amar Brasil (2022)
- CAAP (2022)
Procurada, a Ambec afirmou que a entidade “não pratica atividade ostensiva de captação, prospecção e afiliação de seus associados, sendo tais atividades praticadas por empresas privadas diversas, de forma que, se qualquer fraude ocorreu, a associação é tão vítima quanto seus associados”. Além disso, disse que vê “com surpresa” a operação e que já que vem cooperando, há mais de um ano, com “a Autoridade Policial, Ministério Público e Poder Judiciário”.
O presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), Milton Cavalo, afirmou, por meio de nota, que “o Sindnapi apoia a investigação das denúncias de irregularidades nos descontos em benefícios dos aposentados. Faz parte do DNA do sindicato a defesa dos beneficiários do INSS e a luta contra golpes dos mais diversos que afetam os ganhos dessa população.”
A Contag, por sua vez, diz que recepcionou “diligências” da Operação em sua sede, e que sempre atuou em conformidade com as normas legais.
“Neste momento, a entidade reitera seu respeito às instituições democráticas e o compromisso com a legalidade em todas as suas ações, e se coloca à disposição para colaborar com as investigações em curso, defendendo a total transparência do processo investigatório e apuração devida dos fatos.”
Presidente do INSS afastado
A operação cumpriu 211 mandados de busca e apreensão, além de seis mandados de prisão temporária. Três pessoas foram presas, e três continuavam foragidas até o início da tarde desta quarta-feira, segundo o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski.
Além disso, foram afastados seis servidores, entre eles, o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, além do diretor de Benefícios e Relacionamento com o Cidadão do órgão, o chefe da Procuradoria Federal Especializada, o coordenador-geral de Suporte ao Atendimento ao Cliente (INSS), além do coordenador-geral de Pagamentos e Benefícios (INSS) e um policial federal.
Segundo Lewandowski, foram apreendidos na operação carros, joias e quadros, além de dinheiro em espécie de “alto valor”. O valor total e a quantidade exata apreendida ainda estava em levantamento.
“Por determinação judicial, foram afastados cautelarmente, por suspeita de envolvimento nesses crimes, que são vários, o presidente do INSS, o diretor de Benefícios de Relacionamento com cidadão, procurador-geral junto ao INSS, o coordenador geral de Suporte ao Atendimento ao Cliente, o coordenador geral de Pagamentos e Benefícios. Foram apreendidos muitos bens, carros de luxo de alto valor, dinheiro em espécie, joias e quadros”, afirmou.
Dinheiro será devolvido?
De acordo com o ministro Ricardo Lewandowski, cada caso terá que ser analisado de forma individual, e, “um dia”, após comprovado o crime, os recursos serão devolvidos.
“Cada caso terá de ser examinado individualmente. Evidente que mediante requisição e apuração interna, esse dinheiro, um dia, terá de ser restituído para aqueles que, dos quais, foi retirado indevidamente”, afirmou.
Já o ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, afirmou que os beneficiários podem entrar na plataforma do INSS para solicitar o cancelamento do desconto.
“Para registrar que, há um ano, já colocamos na plataforma digital do INSS o direito de qualquer cidadão cancelar o seu desconto. É só entrar na página e apertar o botão de que quer sair do desconto”, afirmou.
Fonte: Estadão
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