O Senado aprovou nesta quarta-feira (13) o projeto de lei que cria o mercado de carbono e autoriza a União a estabelecer limites para a emissão de gases de efeito estufa no país. O objetivo é obrigar empresas que poluírem acima de determinado patamar a pagar por isso, incentivando uma virada sustentável na economia.
O projeto ganhou prioridade nas últimas semanas para o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que vê potencial de ganhos para o PIB (Produto Interno Bruto) e tentou acelerar a tramitação enviando ministros para negociar com parlamentares. O Executivo planeja apresentar o texto à comunidade internacional na 29ª Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP 29), que começou nesta semana em Baku (no Azerbaijão) e vai até o dia 22 de novembro.
A previsão do Ministério da Fazenda é que o mercado esteja funcionando plenamente em 2030 e que, desse ano até 2040, o PIB brasileiro seja impulsionado em 5,8% no período acumulado. Para 2050, a projeção é de 8,5% no tempo agregado.
A pasta afirma que o mercado de carbono no Brasil tem potencial para cortar 100 milhões de toneladas anuais de emissões de CO2 equivalente em 2040, de acordo com dados do Banco Mundial. Em 2050, o número subiria para 130 milhões.
O texto aprovado cria regras para o mercado, a ser chamado de Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), e será aplicado a atividades que produzem anualmente acima de 10 mil tCO2e (toneladas de dióxido de carbono equivalente). Quem não estiver obrigado a participar da comercialização, como a agricultura, pode participar de forma voluntária.
Será de competência exclusiva da União o estabelecimento dos tetos de emissão, que serão aplicados à soma das atividades produtivas e fontes reguladas pelo SBCE; e, a partir disso, individualmente (de cada empresa, por exemplo). Os números estarão no Plano Nacional de Alocação, de responsabilidade de um comitê interministerial.
Mesmo com a negociação do governo, a tramitação atrasou porque a bancada ruralista expressou sucessivas preocupações sobre os efeitos para a agropecuária. Havia sido manifestado, por exemplo, o temor de que o projeto trouxesse limitações e impedimentos ao direito da propriedade e ao uso da terra.
Para destravar a votação, a relatora, senadora Leila Barros (PDT-DF), acabou acatando uma série de sugestões da oposição para destravar a tramitação —o que permitiu, inclusive, uma aprovação de forma simbólica (sem contagem de votos). Entre elas, parte de uma emenda do senador Rogério Marinho (PL-RN) que prevê que novas normas para o mercado necessitem de consulta prévia à Câmara de Assuntos Regulatórios (a ser composta por entidades de representação dos setores alvo da legislação).
Projetos não são perfeitos, mas certamente houve aqui uma vontade enorme de todos que contribuíram de dar o seu melhor. Vamos colocar o trem nos trilhos porque o Brasil está patinando há anos nesse tema. E a partir daí vamos regulamentar e fazer um debate com os outros setores que têm interesse em estar conosco nessa caminhada”, afirmou Barros.
O senador Marcos Rogério (PL-RO) elogiou a relatora por ter, segundo ele, dado a oportunidade das mudanças. “No final, conseguimos avançar para um texto que, se não na sua integralidade […], nos pontos mais sensíveis conseguimos avançar para um texto de consenso”, disse.
O Senado já havia aprovado há mais de um ano um projeto voltado ao mercado de carbono, mas a Câmara aprovou pouco tempo depois outra proposta voltada ao mesmo tema. Em meio à disputa por quem daria a final sobre o tema, o Senado decidiu trabalhar em cima do texto da Casa vizinha.
Por isso, o projeto agora precisa voltar à Câmara dos Deputados, mas a previsão do governo é que a tramitação seja acelerada. Depois disso, ainda será necessária uma regulamentação detalhada por parte do Poder Executivo.
Alexandre Prado, líder em mudanças climáticas do WWF Brasil, diz que o projeto não é bom por, entre outros pontos, não dar tanto espaço para a sociedade civil nos órgãos de acompanhamento do tema e por excluir a agricultura das obrigações. O texto não prevê cortes nem mensurações de emissões no setor que é o segundo maior gerador de gases de efeito estufa no país e que participará do mercado apenas de forma voluntária.
Além disso, ele diz que a redação está confusa, complexa e difícil de ser explicada aos estrangeiros. “É um projeto de lei que deveria ser simples. Não está bom. Tem muito buraco, muita falha e é muito complexo”, diz.
Mesmo assim, ele acha que o texto é o possível de ser aprovado e dá as bases para os trabalhos avançarem no mercado. “É o que teve. É o PL que foi possível dentro da negociação política que a gente fez no nosso país. Com isso, a gente começa a trabalhar, e o mais importante é que a gente vai aprender com os nossos erros”.
O agro, que ficou de fora das obrigações, é responsável por 27% do total de emissões brasileiras, de acordo com dados do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa) do Observatório do Clima. O setor só perde para o chamado uso da terra, que inclui o desmatamento, com 48%.
Plínio Ribeiro, líder da Decarbon (empresa do grupo Ambipar que trabalha com o mercado de carbono), diz que em outros países a agricultura também acaba ficando de fora da regulamentação por se tratar de um setor de difícil mensuração. “Olhando para as experiências internacionais, é assim que funciona”, afirma.
Ele alerta para o momento da regulamentação, quando serão definidos os limites setoriais de emissão. “Esse ponto é o mais suscetível a lobby. A sociedade civil tem que ficar muito atenta para que esses números sejam factíveis mas também não fiquem muito elevados”, diz.
Fonte: Folha de S.Paulo
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