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Após Master, BC quer deixar mais clara remuneração de corretoras na venda de CDBs

Discussões dentro do BC se inspiram nas regras criadas pela CVM; Eventual liquidação do Master pode levar à maior indenização de depositantes já feita pelo FGC

postado Maria Clara

O Banco Central estuda mudanças para atacar um dos pontos vistos como cruciais para turbinar as captações do Banco Master: a remuneração de assessores financeiros na venda de títulos bancários.

O Master, que até poucos anos atrás era uma instituição financeira de pequeno porte, pode levar o FGC (Fundo Garantidor de Créditos) a fazer a maior indenização de depósitos bancários já realizada, se o banco vier a ser liquidado. Em dificuldade, o banco precisou recorrer a uma linha de liquidez de cerca de R$ 4 bilhões do fundo em maio.

A autoridade monetária avalia tornar mais transparentes para os investidores os potenciais conflitos de interesse que existam na venda de títulos bancários, como os CDBs e as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA). A ideia é trazer para os aplicadores informações sobre a remuneração paga pelos bancos a assessores financeiros na venda desses papéis, segundo uma pessoa com conhecimento das discussões.

Quando vendem um CDB, tanto a plataforma de investimento quanto o assessor financeiro ganham uma comissão do banco emissor, abrindo espaço para questionamentos sobre o motivador da venda: a qualidade do produto para o portfólio do investidor ou o incentivo que o vendedor ganhará.

As discussões dentro do BC se inspiram nas regras criadas pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários) para títulos e valores mobiliários, como ações, e que já estão em vigor de forma plena há um ano. A estratégia é permitir ao investidor compreender, de forma simples e completa, quais custos estão embutidos nos produtos e como se dá a remuneração dos agentes intermediários na venda deles.

O BC está conduzindo os estudos considerando o arcabouço regulatório vigente, as características específicas dos produtos bancários, os modelos de distribuição e o impacto regulatório para instituições financeiras de diferentes portes. A avaliação interna no órgão regulador é que é preciso reforçar os instrumentos de comparabilidade das informações oferecidas aos clientes.

Alguns participantes do mercado defendem que as plataformas também deveriam arcar de alguma forma com eventuais perdas em casos similares ao Master ou que os próprios bancos tenham limites de captação via plataformas limitados, mas enxergam resistência do BC ao pleito, segundo pessoas que participam das discussões.

Caso o Master sofra liquidação ou intervenção, o número de investidores a serem indenizados pode chegar ao redor do milhão, de acordo com duas pessoas familiarizadas com o assunto. Estima-se que o Master tenha cerca de R$ 50 bilhões elegíveis à garantia do FGC, segundo participantes do mercado, o que seria o maior pagamento já feito pela entidade. O resgate do banco de Daniel Vorcaro vai exigir aporte adicional dos bancos ao fundo.

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As plataformas de investimento ganharam impulso há cerca de dez anos, trazendo para os investidores uma gama de produtos de investimento mais ampla que a prateleira dos bancos, ao mesmo tempo que facilitaram o acesso das instituições financeiras ao varejo, reduzindo o custo de captação delas. A atuação delas no caso Master, contudo, tem levantado questionamentos de reguladores, investidores e bancos.

Para vender papéis do Master, os assessores financeiros lançaram mão de dois principais argumentos: o pagamento de uma remuneração elevada ao investidor e a garantia de indenização pelo FGC em caso de quebra do banco até o limite de R$ 250 mil por investidor.

Os papéis do Master chegaram a pagar 140% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário), enquanto outros bancos médios ofereciam cerca de 115% do CDI.

Para facilitar o investimento dentro dos limites da garantia do FGC, as corretoras faziam as contas para o investidor do quanto ele podia investir para não ultrapassar o limite de R$ 250 mil até o vencimento do papel, quando os juros já teriam incorrido, de acordo com emails vistos pela Folha.

A comissão aos assessores também era acima da média. Como os CDBs vendidos pelo banco eram longos e pagavam uma remuneração elevada, essa taxa chegava a mais de 4% do investimento no seu vencimento. Na média da indústria, o valor máximo pago ao assessor é de 0,5% ao ano, com emissões mais curtas e mais baratas.

CONCENTRAÇÃO

A XP tem cerca de R$ 30 bilhões em títulos do conglomerado Master distribuídos, enquanto o BTG tem outros R$ 6,6 bilhões, de acordo com pessoas com conhecimento do assunto. Juntos, eles representam mais de 70% da captação com garantia do FGC emitida pelo banco de Vorcaro, segundo estimativas de mercado.

Os incentivos financeiros recebidos pelas corretoras mais o protagonismo da garantia do FGC nas propagandas a investidores incomoda alguns participantes do mercado, ainda segundo pessoas familiarizadas com as discussões. Elas enxergam na estratégia um fator que contribuiu para a oferta mais agressiva dos títulos do Master por plataformas.

Rafael Chaves, professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getúlio Vargas, avalia que as plataformas agiram conforme as regras do jogo, mas mudanças deveriam ser feitas na regulação para incentivar a análise de perigos.

“Não é correto que um banco que está com muito risco tenha esse risco eliminado da operação. Isso é negativo para o sistema como um todo,” disse. “O Master conseguiu um volume elevado de captação com risco neutralizado pelo FGC.”

Se o Master vier a quebrar, a maior parte da conta ficará com os maiores bancos do país, que são os maiores emissores de depósitos: Itaú Unibanco, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Bradesco e Santander Brasil.

Como emitem CDBs, XP e BTG também vão arcar com as perdas de forma proporcional.

O peso que as plataformas ganharam para a captação de alguns bancos de menor porte também é visto como um ponto de atenção que deveria ser considerado por reguladores. A importância delas para o Master, de acordo com alguns participantes do mercado, se tornou mais parecida com aquela trazida por grandes operações de atacado. Se elas decidem mudar sua recomendação aos papéis ou cortar a distribuição deles, os bancos podem enfrentar desafios de liquidez.

“As plataformas ajudaram na redução de custo e na diversificação do funding de bancos médios, mas a captação via terceiros é menos estável que aquela feita pelo próprio banco com diversos investidores porque a plataforma pode decidir parar de distribuir os papéis,” diz Alexandre Albuquerque, analista sênior da Moody’s Ratings.

O BC já apertou, em agosto, as regras do FGC para os bancos captarem recursos ao dobrar a alíquota de contribuição ao fundo paga pelos bancos que queiram captar volume maior de recursos tendo como atrativo a garantia do FGC. A medida só entra em vigor em 1º de junho de 2026. A mudança foi considerada tímida pelo mercado.

Fonte: Folha

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