Depois de passar por Ásia, Estados Unidos e Europa, o Banco do Brasil concluiu em Marrakesh, no Marrocos, durante as reuniões anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, uma rodada de captações de cerca de R$ 30 bilhões para apoiar a agenda de sustentabilidade do Brasil. No Marrocos, foram fechadas mais duas transações, uma em dólar, outra em euros, e que juntas somam em torno de R$ 5,9 bilhões.
De acordo com o vice-presidente de Negócios de Atacado do BB, Francisco Lassalvia, ainda que pese o receio entre investidores estrangeiros por conta da extensão do conflito no Oriente Médio, há muito interesse em financiar projetos do Brasil, em linha com a pauta de proteção ao meio ambiente, inclusão social e governança (ESG, na sigla em inglês).
A atenção internacional se dá ao mesmo tempo em que uma ofensiva do governo atual tenta reinserir o País na comunidade global, sobretudo, em relação aos compromissos sustentáveis. Ao mesmo tempo, se dá em um cenário desafiador sob os aspectos econômicos e geopolíticos, o que limita as oportunidades de investimento ao redor do globo.
“Há muito interesse em ouvir de Brasil e, em especial, recursos baratos para projetos de energia renovável, pequenas e médias empresas, Amazônia sustentável, bioeconomia, empreendedorismo feminino”, diz Lassalvia, em entrevista exclusiva ao Broadcast, em Marrakesh, durante as reuniões anuais do FMI e do Banco Mundial.
Uma das operações que o BB fechou no Marrocos foi um acordo para a captação de US$ 800 milhões, que corresponde a cerca de R$ 4 bilhões, com um consórcio de bancos formado por JPMorgan, Standard Chartered, HSBC e Credit Agricole. Os recursos serão destinados a financiar operações agrícolas no Brasil para plantio direto, para pessoas físicas ou jurídicas, com prazo de 10 anos.
O negócio conta com garantia de 95% do MIGA, braço do Banco Mundial, que eleva o rating da operação para ‘AAA’, ou seja, da mais alta qualidade, e elimina a necessidade de o BB fazer provisões para o empréstimo. Como consequência, o custo para emprestar aos tomares finais reduz.
O BB assinou ainda uma carta de intenções com o Banco Europeu de Investimento (EIB, na sigla em inglês) que prevê mais 350 milhões de euros, o equivalente a R$ 1,869 bilhões, para financiar projetos de energia renovável, com prazo de 20 anos. Da cifra total, uma fatia de até 30% será destinada a micro e pequenas empresas.
Segundo o vice-presidente de Controles Internos e Gestão de Riscos do BB, Felipe Prince, há bastante interesse no exterior em financiar o empreendedorismo porque além de integrar a pauta ESG, o segmento gera emprego, renda e serve de motor para o ciclo econômico. Os baixos índices de inadimplência do banco neste segmento, além do crescimento robusto, ajudam a atrair o apetite externo, segundo ele.
A carteira de crédito do BB voltada a micro, pequenas e médias empresas somava R$ 116,5 bilhões ao fim de junho, cifra 21,8% maior quando comparada com o mesmo período de 2022. O segmento engloba negócios com faturamento anual até R$ 200 milhões. O índice de inadimplência, considerando atrasos acima de 90 dias, é em torno de 5%, menor que o de concorrentes, conforme os executivos.
“Uma dificuldade que nos relataram é que, em grande parte dos países e bancos, esses portfólios de empréstimos a pequenas empresas vão performar mal”, conta Prince, ao Broadcast.
Relatório de estabilidade financeira do FMI divulgado esta semana alerta para o risco de uma onda global de calotes, em meio aos juros elevados nas economias. A preocupação com o sistema financeiro, após o estresse com bancos americanos e na Europa no início do ano, dá lugar ao temor de que, em um cenário de condições financeiras apertadas, os tomadores tenham maiores dificuldades de honrar suas dívidas e venham a se tornar inadimplentes.
“O fato de os nossos índices de inadimplência serem baixos pode ser uma oportunidade no futuro, nos abrindo portas para captar mais recursos que não seriam atrelados a ambiental, mas ao lado social”, diz Prince.
O BB fez mais de 30 reuniões em Marrakesh com representantes de bancos de desenvolvimento, gestoras e bancos comerciais. Os encontros encerram uma maratona da instituição para levantar recursos para a agenda sustentável do País. O conglomerado mira alcançar meio trilhão de reais de sua carteira de crédito com pegada sustentável até 2030. Hoje, são mais de R$ 323 bilhões, o que representa um terço dos empréstimos totais, de R$ 1,04 trilhão.
Lassalvia afirma que os investidores internacionais têm cobrado com mais intensidade compromissos sustentáveis para emprestar. A agenda ESG passa a ser obrigatória e as empresas que emitem e poluem precisam comprovar na prática formas de compensar, além do retorno. “O que a gente vê é que, cada vez mais, o que não for verde vai pagar mais caro para se financiar ou não vai encontrar recursos”, diz. Para ele, o banco vem trabalhando na construção de um inventário de crédito de carbono dos clientes.
Fonte: Estadão
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