Ilan Goldfajn, que comandou o Banco Central do Brasil no governo de Michel Temer (MDB), foi eleito neste domingo (20) o novo presidente do BID (Banco Interamericano do Desenvolvimento). Ele será o primeiro brasileiro a dirigir a instituição, que financia projetos de desenvolvimento no continente e tem sede em Washington.
O resultado também é uma vitória para o ministro da Economia, Paulo Guedes, que indicou Ilan. Após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, houve pressão contra o brasileiro por parte do PT, que queria sugerir outro nome. Mesmo assim, Ilan foi eleito em primeiro turno na Assembleia de Governadores, que reúne representantes dos países que compõem o banco, com votos que representam 80% do capital da entidade. Ele assume o cargo no dia 19 de dezembro.
Presidente do Banco Central entre 2016 e 2019, Ilan, 56, é hoje diretor de Hemisfério Ocidental do FMI (Fundo Monetário Internacional), cargo do qual se licenciou para disputar a eleição do BID.
Nascido em Israel e filho de brasileiros, é formado em economia na Universidade Federal do Rio de Janeiro, com doutorado pelo MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), nos EUA.
Ele concorria com outros quatro candidatos: a argentina Cecilia Todesca Bocco, secretária de Relações Econômicas Internacionais da chancelaria do país; o mexicano Gerardo Esquivel, um dos diretores do banco xentral do país; o chileno Nicolás Eyzaguirre, ex-ministro da Economia; e Gerard Johnson, de Trinidad e Tobago, ex-funcionário do BID.
O ex-presidente do Banco Central do Brasil, Ilan Goldfajn – Ueslei Marcelino – 22.jan.2019/Reuters
A eleição do brasileiro foi facilitada depois que o governo Alberto Fernández abriu mão da candidatura de Todesca Bocco na reta final e decidiu apoiar Ilan, que já tinha apoio dos Estados Unidos.
Como EUA, Brasil e Argentina têm a maior parte das ações do banco (30% para o primeiro, 11,4% para cada um dos dois últimos), o caminho se abriu para o brasileiro.
Guedes fez um giro com autoridades do continente em Washington no mês passado, durante as reuniões anuais do FMI e do Banco Mundial, na tentativa de angariar apoio ao brasileiro. Os candidatos foram alvo de sabatina no dia 12, e Ilan foi o que causou a melhor impressão.
A candidatura foi ameaçada, porém, quando Jair Bolsonaro (PL) perdeu a eleição, porque o PT trabalhou para adiar o pleito do BID e emplacar outro nome que não o do indicado pelo presidente.
O ex-ministro petista da Fazenda Guido Mantega chegou a enviar um email à secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, no qual solicitou que o pleito fosse adiado por 45 a 60 dias. A eleição, porém, não foi adiada, mas a escolha de Ilan ficou ameaçada, uma vez que autoridades não queriam correr o risco de se indispor com o próximo presidente do Brasil.
Na quinta-feira (17), no entanto, Mantega renunciou ao seu cargo na equipe de transição do governo Lula, o que voltou a dar tração no BID ao ex-presidente do Banco Central.
Neste domingo, Yellen parabenizou Ilan pela vitória e disse que o BID desempenha um papel vital na promoção do bem-estar econômico, social e ambiental da América Latina e do Caribe.
“Os EUA esperam trabalhar com o presidente Goldfajn para implementar o conjunto de reformas que os acionistas estabeleceram para reforçar o desenvolvimento sustentável, inclusivo e resiliente; crescimento liderado pelo setor privado; ambição climática; e aumentar a eficácia institucional do BID”, disse, em comunicado.
O Ministério da Economia disse em nota que celebra a eleição de Ilan e que o resultado foi conquistado após campanha liderada pela pasta.
“O candidato brasileiro alcançou ampla maioria, superando os critérios de percentual do capital votante do banco e de apoio regional, o que permitiu que a eleição fosse concluída na primeira rodada”, afirmou.
Para a pasta comandada por Guedes, a vitória do candidato é um reconhecimento da plataforma apresentada pelo Brasil para que o banco priorize três eixos centrais. São eles infraestrutura física e digital, com mobilização de recursos privados e criação de oportunidades para a integração regional; combate à pobreza, desigualdade e insegurança alimentar; e mudança do clima e biodiversidade.
Conforme mostrou reportagem da Folha, as prioridades de Ilan apresentadas no processo seletivo do banco se alinhavam também às de Lula e incluíam combater a fome, promover a cooperação entre países, fomentar crescimento com inclusão social, diversidade e preservação ambiental.
Para Otaviano Canuto, que foi vice-presidente do Banco Mundial e do BID e diretor-executivo do FMI e do Banco Mundial, a escolha foi acertada.
“Ilan tem as características pessoais e o perfil de alguém ótimo para dirigir uma instituição como essa”, afirma, elogiando o foco do brasileiro em energia limpa, segurança alimentar, aumento da cooperação regional e conservação de recursos naturais.
“O desafio vai ser buscar algum processo de aumento de capital, para aumentar a escala do que o banco faz.”
Fundado há 63 anos, o BID é considerado o maior e mais antigo banco de desenvolvimento multilateral regional do mundo e financia projetos de desenvolvimento econômico, social e institucional na América Latina e no Caribe. Tem 48 países-membros e sede em Washington (EUA).
Em novembro de 2022, estavam previstos quase US$ 30 bilhões (R$ 160 bilhões) pelo BID para projetos em preparação ou implementação no Brasil. Entre eles, programas para potencializar negócios de bioeconomia na Amazônia, expansão do ensino em Florianópolis (SC), investimentos rodoviários no estado de São Paulo, pecuária sustentável em Mato Grosso, além de uma série de ações federais.
A eleição deste domingo põe fim a um conturbado período que começou com a chegada de Mauricio Claver-Carone ao posto, em 2020. Acusado de se envolver com uma subordinada, o americano foi destituído por unanimidade em setembro.
No ano da eleição de Claver-Carone, havia forte disposição para que os países que compõem o banco elegessem um brasileiro. Uma série de nomes foram discutidos, como Marcos Troyjo (hoje no banco dos Brics); Rodrigo Xavier; Carlos da Costa (ex-BNDES) e Martha Seillier (ex-secretária do Programa de Parcerias e Investimentos), mas sem sucesso.
O Brasil desistiu de emplacar um indicado após um pedido direto do então presidente dos EUA, Donald Trump, a Jair Bolsonaro para que o país apoiasse Claver-Carone, então diretor de Assuntos para o Hemisfério Ocidental no Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca. A conturbada gestão do americano, no entanto, chegou ao fim antes que ele completasse o mandato de cinco anos.
Em entrevista recente à Folha, Claver-Carone, desafeto de Paulo Guedes, afirmou que o país tinha feito uma má escolha ao apoiar sua destituição e que não encontraria agora apoio para eleger um nome próprio.
BID (BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO) Fundado em 1959
Seus recursos vêm dos seus 48 países-membros e de captações nos mercados financeiros, entre outras fontes
O poder de voto é proporcional ao capital subscrito pelo país
Os EUA são o país com maior poder de voto na instituição, 30%,
Brasil e Argentina têm 11,4% cada um
Cada país-membro indica um governador, geralmente, o ministro da Fazenda ou Economia
US$ 23,4 bilhões foi o valor da carteira de financiamento do banco para projetos em 2021
PAÍSES-MEMBROS
Alemanha, Argentina, Áustria, Bahamas, Barbados, Bélgica, Belize, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile, China, Colômbia, Costa Rica, Croácia, Dinamarca, El Salvador, Equador, Eslovênia, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Guatemala, Guiana, Haiti, Honduras, Israel, Itália, Jamaica, Japão, México, Nicarágua, Noruega, Países Baixos, Panamá, Paraguai, Peru, Portugal, Reino Unido, República da Coreia, República Dominicana, Suécia, Suíça, Suriname, Trinidad e Tobago, Uruguai e Venezuela
PRESIDENTE DO BID
Eleito pela Assembleia de Governadores
Responsável pela condução do dia a dia
Nas sessões da diretoria-executiva não vota, exceto em caso de empate
Fonte: Folha de São Paulo
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