As expectativas se confirmaram, e a Argentina registrou uma inflação mensal de 12,4% em agosto, quando o país passou por eleições primárias e uma explosão do dólar. Além de ser quase o dobro do valor de julho, é a primeira vez que o indicador atinge dois dígitos em 21 anos e é o registro mais alto desde 1991.
Já o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) acumulado nos últimos 12 meses foi de 124%, um dos mais altos do mundo, conforme informou nesta quarta-feira (13) o Indec, o IBGE da nação vizinha.
A inflação mensal não estava tão alta desde 1991 (27%), pouco antes da chamada “conversibilidade”, quando o governo de Carlos Menem decretou que um peso valeria um dólar. A última vez que o IPC mensal chegou aos dois dígitos foi em abril de 2002 (10,4%), justamente depois de o país ter abandonado esse modelo de paridade.
O aumento era esperado pelos mercados depois que o ministro da Economia e candidato presidencial, Sergio Massa, determinou uma desvalorização de 21% da moeda oficial em 14 de agosto, logo depois das primárias. A medida havia sido acordada com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para destravar desembolsos do empréstimo de US$ 44 bilhões feito com o órgão.
Essa cotação, usada em transações comerciais e oficiais, foi de 300 a 366 pesos de um dia para o outro, arrastando todas as demais. Somou-se a isso a surpresa do êxito do ultraliberal Javier Milei, que espalhou um forte clima de incerteza no país, e a elevação da taxa de juros de 97% para 118% ao ano (percentual até então próximo à inflação).
Seguiu-se então uma enxurrada de remarcações de preços e a paralisação da venda de certos produtos e serviços por alguns dias à espera de uma estabilização, já que os argentinos ficaram sem referência. Brasileiros que vivem ou visitam o país também ficaram desnorteados, uma vez que a cotação em reais sobe na mesma proporção.
No fim de agosto, a Folha mostrou que as vendas ainda não haviam se estabilizado integralmente, e certos produtos seguiam faltando poucas semanas antes das eleições presidenciais de 22 de outubro, nas quais os candidatos opositores prometem aplicar um forte ajuste fiscal.
A Argentina já teve dois episódios de hiperinflação —em 1989, de 3.079% ao ano, e em 1990, de 2.314%. O país adotou então a “conversibilidade” do peso com o dólar, em uma paridade fixa de 1 para 1, apoiada em privatizações, desregulamentações e uma abertura total da economia.
A inflação anual caiu para um dígito na época, mas o aumento das importações aumentou a dívida em moeda estrangeira, arruinou a indústria e provocou uma grave recessão que precipitou a crise política de 2001 e a desvalorização do peso.
O relatório FocusEconomics de setembro, que reúne mais de 40 analistas de bancos e consultorias, estima que a inflação fechará em 2023 maior do que no ano anterior, “impulsionada pelo colapso do peso em meio ao financiamento monetário do déficit fiscal” —ou seja, a impressão de dinheiro para financiar a dívida pública.
“Uma desvalorização do peso mais rápida do que o esperado e a generosidade fiscal antes das eleições de outubro são riscos-chave”, dizem os especialistas.
Fonte: Folha de S. Paulo
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