O Banco Central divulgou nesta terça-feira a Ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) com um aceno ao Ministério da Fazenda, responsável pela elaboração da nova âncora fiscal. O documento – que tradicionalmente justifica a decisão da autarquia em relação à taxa de juros – fez também diversas sinalizações ao governo Lula e às discussões levantadas nos últimos meses, como meta de inflação e juros subsidiados. Veja os cinco principais pontos:
Ministério da Fazenda e arcabouço fiscal
O Banco Central deixa explícito que não há relação direta entre a apresentação da nova âncora fiscal e eventual queda da inflação. O Copom destaca que só um arcabouço “sólido” e “crível” levará ao processo de redução do nível de preços, quando houver alinhamento das expectativas.
As projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência (de efeito da política monetária) estão em 5,8% para 2023 e 3,6% para 2024. Uma alta em relação ao comunicado de fevereiro, que considerava uma inflação projetada em 5,6% para 2023 e 3,4% para 2024.
“O Comitê seguirá acompanhando o desenho, a tramitação e a implementação do arcabouço fiscal que será apresentado pelo Governo e votado no Congresso”, diz a Ata, em referência indireta ao fato de a nova regra fiscal não ser definitiva após aval do governo, e sim após aprovação no Congresso.
— A apresentação do arcabouço fiscal só afeta a política monetária na medida em que sensibiliza as expectativas de mercado, sugerindo que não necessariamente cortes nos juros vão seguir a apresentação/aprovação do arcabouço — avalia Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos.
Embora tenha reconhecido o “compromisso” da Fazenda com a execução do pacote fiscal, o Banco Central continuou enfatizando a “incerteza” sobre o equilíbrio das contas públicas no longo prazo e o impacto na dívida pública.
BNDES e juros subsidiados
Roberto Campos Neto e os oito diretores mencionam indiretamente que a possibilidade da volta de juros subsidiados pode reduzir a efetividade da política monetária – que em termos gerais deixa o “crédito mais caro” para conter a inflação.
A referência é ao BNDES – que vem ventilando para a prática de juros abaixo do mercado. No governo Temer o banco público trocou os juros subsidiados pelo Tesouro Nacional por uma outra referência, que segue o mercado de juros futuros.
— Em destaque, A ata menciona o risco de políticas parafiscais [expansionistas], que seria a volta de subsídios do BNDES, e o impacto na Selic, que teria que ficar mais alta por mais tempo, devido à perda de alcance da política monetária — menciona Rafaela Vitória, economista-chefe do Inter.
Lula e mudanças nas metas de inflação
A “desancoragem” das expectativas de inflação tem como um dos motivos os questionamentos sobre uma possível alteração de metas, segundo o Banco Central. São repetidas as críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de aliados à meta de inflação – considerada pela ala política do governo como baixa e de difícil alcance.
Em 2023, o centro da meta é 3,25% com teto de 4,75%. Para 2024, a meta é de 3%, até o limite de tolerância de 4,5%. O objetivo do Banco Central é trazer a inflação dentro desse parâmetro.
“O Comitê avalia que a credibilidade das metas perseguidas é um ingrediente fundamental do regime de metas de inflação e contribui para o bom funcionamento do canal de expectativas, tornando a desinflação mais veloz e menos custosa”, diz a Ata do BC.
Paciência e serenidade
O Banco Central também destaca que os efeitos práticos da Política Monetária – com a desaceleração da atividade econômica e consequentemente da inflação – demanda “serenidade e paciência”. O documento divulgado nesta terça-feira buscou passar informações para um público maior, na avaliação de Flávio Serrando, economista da Blueline.
Uma das mensagens centrais na Ata é em relação ao processo de deterioração das expectativas de inflação, assim como foi mencionado no Comunicado da última semana. A Ata reforça o comprometimento de trazer a inflação de volta para a meta.
— BC voltou a ressaltar a importância de “serenidade e paciência” na condução da política monetária, o que sugere (junto com todo o resto do documento) que a Selic ainda deve ficar parada por vários meses até que as condições para os cortes se materializem — diz a economista Luciano Sobral, da Neo Investimentos
Lei de Autonomia
O Banco Central deixou explícito na ata que o “objetivo fundamental” da autarquia é a estabilidade de preços. A referência foi ao artigo 1º da Lei complementar 179/21, que definiu a autonomia do BC. Recentemente, o presidente Lula argumentou que Campos Neto estaria descumprindo essa Lei, ao afetar a taxa de emprego no país com a elevação de juros.
Conforme a norma, a busca pelo “pleno emprego” é também responsabilidade do BC, “sem prejuízo de seu objetivo fundamental” – que é o controle da inflação. Em termos práticos, o BC combate a inflação no primeiro momento, para depois buscar o pleno emprego, que só seria viabilizado com índices de preços dentro da meta.
“Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego”, diz a ata do BC.
Fonte: O Globo
www.contec.org.br