A criação de um imposto de 2% sobre a riqueza dos 0,2% mais ricos do Brasil seria suficiente para arrecadar R$ 41,9 bilhões por ano, segundo cálculo do Made/USP (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo) publicado nesta quarta-feira (22).
Esse valor seria suficiente para triplicar o orçamento do Ministério da Ciência e Tecnologia e aumentar em mais de dez vezes o orçamento do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas de 2023.
Também é equivalente a cerca de 25% do total gasto com o Bolsa Família em 2023, ano de investimento recorde no programa.
Incidindo sobre os 0,2% mais ricos do país, o imposto atingiria 267.460 mil pessoas no Brasil que têm riqueza declarada de mais de R$ 13 milhões e uma renda média mensal de R$ 218 mil, segundo a publicação do Made/USP.
“O perfil de riqueza desses 0,2%, é bem diferente do resto da população”, diz o economista Guilherme Klein, professor da Universidade de Leeds, no Reino Unido e pesquisador associado do Centro.
A grande maioria dos brasileiros que possuem alguma riqueza declarada (somente 27% da população) têm a maior parte disso acumulado em imóveis —em média, R$ 97 mil. “Em geral, são as casas onde as pessoas moram”, explica o economista.
Enquanto isso, a maior parte da riqueza dos 0,2% no topo é composta por ativos financeiros, diz o estudo. Ou seja, é composta por ações, fundos de investimentos, títulos de dívida, letras de crédito, etc.
O estudo foi feito com base na proposta dos economistas franceses Thomas Piketty, Gabriel Zucman e Emmanuel Saez em seu relatório global de 2022 de criar um imposto global mínimo sobre a riqueza dos bilionários.
Também foi baseado no trabalho desses economistas que, neste ano, o Brasil liderou uma proposta no G20, grupo dos países mais ricos, de criar uma taxação global mínima de 2% sobre a riqueza dos bilionários.
A vantagem desse acordo internacional, segundo o economista francês Gabriel Zucman —convidado pelo Brasil a falar em uma reunião do G20 em Brasília nesta semana— é evitar que os super-ricos movimentem essa riqueza internacionalmente para fugir dos impostos.
A principal crítica normalmente feita a esse tipo de proposta de taxar super-ricos é a possibilidade de fuga de capital.
“Um acordo internacional diminui as chances de países ‘perderem’ residentes, porque vai haver um imposto mínimo global”, disse Zucman à BBC News Brasil em março.
A análise do Made leva em consideração que os ativos financeiros que compõem a riqueza dos 0,2% no topo são muito mais fáceis de movimentar.
“Os super-ricos podem facilmente mudar de local e movimentar suas riquezas, que são compostas por ativos financeiros e por essa natureza são mais móveis”, reconhece Klein.
“Inclusive é uma coisa que a gente mostra na pesquisa também. Por isso, é tão importante que haja uma articulação política global para tornar viável a proposta.”
Quanto às críticas de que esse nível de articulação seja muito ambicioso, Zucman defendeu a ideia de que um acordo global não é irrealista e poderia acontecer nos moldes da taxação mínima internacional sobre empresas multinacionais, iniciativa proposta pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para reduzir o envio de lucros para paraísos fiscais e que foi aprovada em 2021 por 140 países.
“É possível ter um grande número de países, como aconteceu em 2021, quando 140 países concordaram com um imposto mínimo de 15% para multinacionais”, disse ele à BBC News Brasil.
“É possível criar esse imposto de uma forma que os ricos não poderiam evitá-lo se mudando. É muito importante entendermos que a competição tributária internacional não é uma lei da natureza. É uma escolha política. Podemos escolher tolerar isso ou não.”
A implementação global desse imposto mínimo, segundo ele, aconteceria de forma a complementar o que já se paga de imposto localmente.
Por exemplo, em um país onde os mais ricos já pagam o equivalente a 1% de imposto, essa taxação seria aumentada até atingir 2%.
Fonte: Folha de S. Paulo
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