A Câmara de Cascais, município da área metropolitana de Lisboa, aprovou no mês passado uma política que ficou conhecida como “licença de avosidade”. Quando nasce uma criança, os avós têm direito a um mês sem trabalhar para ajudar os pais a cuidar da criança. A “licença de avosidade” foi desenhada para o setor público—mas quem aderir no setor privado recebe benefícios fiscais. Depois da Itália, Portugal é o país com média de idade mais elevada dentro da União Europeia.
“Não tenho dúvida que, dentro de algum tempo, essa política estará generalizada no país”, disse Carlos Carreiras, presidente da Câmara de Cascais, em entrevista ao jornal lisboeta O Expresso. Em Portugal, o cargo de presidente da Câmara equivale ao de prefeito no Brasil. A iniciativa da Câmara de Cascais está em sintonia com um movimento inaugurado em 2002 sob a chancela da OMS (Organização Mundial de Saúde): a criação de Cidades Amigas do Envelhecimento.
“2002 foi o primeiro ano em que a população acima de 65 anos superou o número de crianças com menos de cinco, e também o primeiro ano com a maioria da população do planeta vivendo em cidades”, diz Gustavo Sugahara, economista brasileiro radicado em Lisboa. “Desde então, ficou claro que o mundo teria cada vez mais idosos e eles morariam principalmente em cidades, o que gerou um cruzamento entre questões de envelhecimento e de urbanismo”.
Sugahara foi o líder da força-tarefa que idealizou a “licença de avosidade”, no bojo de um grupo amplo de políticas públicas destinadas à terceira idade. Tudo começou há dois anos, quando a Câmara de Cascais abriu um concurso junto a universidades para incentivar pesquisas sobre o tema. O vencedor foi o ISCTE (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa)—faculdade que, em Portugal, tem prestígio equivalente ao da Fundação Getúlio Vargas no Brasil.
Além de pesquisador acadêmico, Sugahara é consultor das Nações Unidas e foi um dos responsáveis pelas políticas públicas criadas em Oslo quando a capital da Noruega decidiu entrar para o clube das Cidades Amigas do Envelhecimento. No ISCTE, a missão de sua equipe era identificar a necessidade dos cidadãos com 65 ou mais de Cascais e sintonizar o ensolarado município português — um dos destinos preferidos dos brasileiros que se aposentam em Portugal — com as melhores práticas internacionais.
“As demandas nessa faixa etária são muito parecidas em todas as cidades, e têm a ver principalmente com dois assuntos: mobilidade e trabalho”, diz Sugahara. Segundo ele, às vezes as soluções são bastante simples. Na Suíça, por exemplo, um problema recorrente dos mais idosos era o tempo escasso nas conexões de trens. Modificaram-se os algoritmos e esse tempo foi alargado—algo viável na Suíça, país-modelo em transporte público integrado.
Em alguns lugares, de acordo com Sugahara, as necessidades das pessoas com 65 anos ou mais entram em conflito com demandas de outros grupos sociais. Em Nova York, cidade cujo centro é plano e com calçadas largas, a demanda dos “senior citizens” era por bancos que possibilitassem um descanso em meio às caminhadas. Os bancos foram instalados, mas os moradores de Manhattan reclamaram ao vê-los ocupados, à noite, por cidadãos em situação de rua. A política pública foi abortada.
Fonte: Folha de S. Paulo
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