Início » “Não temos recursos para bancar bônus a servidores previsto na reforma administrativa”, diz Dweck

“Não temos recursos para bancar bônus a servidores previsto na reforma administrativa”, diz Dweck

Ministra diz que proposta da Câmara traz boas ideias que podem ser difíceis de serem aplicadas. Restrição aos supersalários e o fim das férias de 60 dias são apoiadas pela pasta

postado Maria Clara

A ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, aponta risco de aumento de despesas para União, Estados e municípios com a proposta da reforma administrativa de criação de uma 14ª folha para o pagamento de bônus aos servidores. O benefícios seria vinculado ao atingimento da meta dos órgãos da administração pública.

“Não tenho condições de pagar uma 14ª folha “, diz ela. Segundo a ministra, o governo teria que segurar reajustes dos salários para ter espaço para pagar o bônus. A ideia integra a proposta em elaboração pelo GT (grupo de trabalho) da reforma administrativa da Câmara, coordenado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ).

Na primeira entrevista após o deputado antecipar os principais pontos da reforma, Dweck diz à Folha que vê com preocupação as propostas de redução de 50% dos salários iniciais das carreiras e de uma tabela única de remuneração salarial para todos os servidores públicos do país.

A ministra disse que o risco é de os estados e municípios acabarem batendo na porta do governo federal para bancar o aumento das despesas com a reforma. “Muitas propostas, em tese, são boas, mas não são fáceis de fazer na prática”, afirma. Ele diverge da necessidade de um novo modelo de contrato temporário.

Dweck apoia as propostas de combate ao privilégios, como a restrição aos supersalários e o fim das férias de 60 dias, para alcançar os atuais servidores da ativa. “Se a gente não enfrentar isso agora, vai ser uma decepção para a sociedade. Vai ser muito frustrante”, afirma a ministra, que defende que a tramitação da proposta seja discutida numa comissão especial antes de ir para o plenário da Casa.

O que achou das propostas antecipadas pelo deputado Pedro Paulo?
Vemos um avanço na discussão. Uma mudança até de postura do Legislativo. Quando entramos no governo, estávamos dialogando com a PEC 32 [apresentada pelo governo Bolsonaro], que tinha um viés punitivista. Tanto o presidente Hugo Motta [Republicanos-PB] quanto o deputado Pedro Paulo estão mais alinhados com a nossa visão sobre o que seria uma boa reforma, que é tornar o Estado mais eficiente.

Nosso objetivo não é o fim da estabilidade. Várias propostas [da reforma] têm uma lógica de nacionalizar coisas que foram feitas no Ministério nos últimos dois anos, como alongar a carreira, o Concurso Nacional Unificado. É claro que, no detalhe, pode ter algum tipo de divergência maior.

O deputado propõe uma redução de 50% do salário inicial das carreiras. O que achou?
Está aí um primeiro ponto que temos dúvida. Não conhecemos o texto final, mas tem carreiras que o salário inicial é muito baixo e que tem amplitude [distância do piso ao topo] baixa. No Executivo, para algumas carreiras, reduzimos o salário de entrada. Mas tem carreiras em que não daria para reduzir. Você não pode falar que todo mundo tem que diminuir pela metade. Obrigar todo mundo a fazer, ou vai ser uma injustiça, que é ter salário muito baixo, ou um negócio que tem impacto fiscal grande para aumentar o salário.

Qual é a solução?
Ir dando reajustes diferenciados mais para cima, nas [que têm] baixos [salários]. Em geral, elas têm um quantitativo grande. Se não baixar o salário de entrada, vou ter que aumentar o de saída. Tem muita gente aposentada ganhando salário final, o impacto disso é gigantesco nas contas do governo. É uma coisa que precisa ser negociada. Tem que ser uma grande diretriz, mas não necessariamente um comando legal obrigatório com tempo limitado para ser feito.

O governo defende a proposta de criação de uma tabela única salarial para União, estados e municípios?
Muitas propostas, em tese, são boas, mas não são fáceis de fazer na prática. A gente foi tentar igualar todo mundo e não conseguiu. Custa caro, vai aumentar a despesa, porque não tem como reduzir o salário de ninguém. Acho que a ideia [do Pedro Paulo] era dar um tempo para isso, de uns dez anos, mas eu não sei como está.

Para conseguir fazer isso minimamente, tem que segurar um pouco quem está em cima. Não é trivial. A solução não é tão simples, rápida e barata. Se botar obrigações para estados e municípios que gerem impacto fiscal, vão bater aqui e pedir para a gente bancar.

A proposta de contratação por meio de um vínculo de estatutário temporário está na direção certa?
Já existe o temporário, que tem uma regra própria. Esse instituto precisaria ser melhorado, porque tem sido usado, às vezes, de forma indiscriminada e precária. Na nossa visão, é mais interessante fortalecê-lo do que criar uma nova forma de contratação que pode ter riscos de precarização. Pode-se ter várias discussões sobre o contrato temporário, como a padronização de tempo, as regras para a entrada e a proteção àquela pessoa.

O deputado Pedro Paulo disse que não vai colocar na reforma mudança na estabilidade?
A estabilidade foi pensada como forma de evitar perseguição política. Agora, não pode ser uma maneira de proteger o mau servidor. Tem que ter como contrapartida uma boa avaliação de desempenho e aumentar o controle social sobre o que os servidores fazem.

Podemos demitir a pessoa de forma sumária. Teve um caso recente, que está previsto na Constituição, que é desídia, ou seja, preguiça, na Anac. A partir do PGD, que é o Programa de Gestão e Desempenho, pode ter redução do salário por não cumprimento do plano de trabalho. Isso já aconteceu e está normatizado.

Temos algumas concordâncias de que precisa ter metas individuais e institucionais. Um bônus associado a isso que eu já acho que é um pouco mais complexo do ponto de vista fiscal e de como implementar isso.

O governo tem problema com bônus?
Isso. Se for um bônus igual ao da Receita [Federal], serve para pouca coisa. Não pode ser uma obrigação. Essa é a típica coisa que os estados e municípios vão pedir dinheiro para gente. Não temos dinheiro nem para o nosso, não tenho condições de pagar uma 14ª folha.

Aí entra um outro ponto que a gente discorda, que é a questão da competição entre os servidores. Se todo mundo for bem, vai ter que pagar mais para um e menos paro outro. Não é trivial. Vai ter que segurar reajustes para ter espaço para a 14ª folha. Temos preocupação fiscal com isso, principalmente se for uma obrigação para estados e municípios, porque a chance de a conta vir para a gente é enorme.

E o caso dos honorários bilionários de membros do AGU? Como conter?
O Supremo, já em 2020, definiu que o honorário está dentro do teto. A gente vinha cumprindo isso à risca. Mas houve algum pagamento de indenizações retroativas, aí entra na lógica do Judiciário, que somos críticos. O honorário é pago por uma instituição privada, diferente do bônus da Receita, pago pelo Executivo. Fundos privados são uma coisa muito ruim, porque a gente perde a capacidade de impor regras.

O que acha das propostas para conter os supersalários e combater privilégios, como as férias de 60 dias?
Temos consenso no diagnóstico, mas não sei qual é o texto final. Classificar o que é verba indenizatória é superimportante, e impedir de criar novas verbas. Mas precisa ter diálogo entre os Poderes. Conseguir aprovar é difícil.

Acho bom que o Legislativo esteja disposto a encarar isso agora. O Executivo também está. Vamos sentar com o Judiciário e negociar. Se a gente não enfrentar isso agora, vai ser uma decepção para a sociedade. Vai ser muito frustrante

Mas qual o empenho de fato do governo? A ministra Gleisi (Hoffmann, Relações institucionais) já apresentou resistências no passado.
Eu e ela tínhamos a mesma visão. De que o GT, da maneira como foi pensado inicialmente, [com prazo de] 45 dias, dificilmente ia conseguir fazer mudanças estruturais. Mas queremos que aprove alguma coisa que combata privilégios.

O presidente Hugo Motta disse que vai chamar uma comissão geral que vai direto para o plenário…
Se fosse uma PEC, a gente preferia que tivesse uma comissão especial, mesmo com um pactuado para não protelar. A gente tem alguns pontos de preocupação. O texto é o mais relevante, porque qualquer coisa pode ser muito ruim ou pode ser muito boa. Consenso sem texto não existe.

A proposta para fixar um teto salarial para os diretores estatais não dependentes com capital fechado tem resistência do governo?

Qualquer trabalhador da estatal dependente está no teto [do funcionalismo]. As não dependentes têm receita das suas atividades de empresa, como qualquer outra empresa. Elas ganham suas receitas e pagam seus salários. Não faz sentido essa diferença entre capital aberto e capital fechado. Mesmo nas não dependentes, têm poucas que os salários de presidente estão fora do teto.

Os Correios estão como dependentes? É um problema o prejuízo da empresa?
Como não dependente, com salário abaixo do teto. O prejuízo é um problema. Estamos dialogando com o Ministério das Comunicações, com a própria empresa, para ver qual vai ser a maneira dela reverter essa situação financeira, que é preocupante.

 

RAIO-X | ESTHER DWECK, 48

É ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. Entre 2011 e 2016, atuou no Ministério do Planejamento, onde foi chefe da assessoria econômica e secretária de Orçamento Federal. Também trabalhou como subchefe de análise e acompanhamento de políticas governamentais da Casa Civil. É professora de economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

 

por Adriana FernandesLuany Galdeano

Fonte: Folha

www.contec.org.br

Deixe um Comentário

Notícias Relacionadas